6 APRENDIZADOS OBTIDAS COM ASSALTOS MILIONÁRIOS          

                              

Assaltos milionários têm em comum a capacidade dos criminosos explorar com êxito pontos fracos da segurança, por isso se tornam excelentes casos de aprendizado para quem pensa e cuida da proteção de ativos.

Para fundamentar os 6 aprendizados deste conteúdo debruçamo-nos sobre dois assaltos emblemáticos, à agência 0262 do Itaú Unibanco, em São Paulo, Brasil e ao Museu Green Vault, em Dresden, Alemanha.

 

DATAS DAS OCORRÊNCIAS E PERDAS

O furto da agência 0262 do Itaú Unibanco, em São Paulo, Brasil, ocorreu na noite entre os dias 27 e 28 de agosto de 2011, com perdas estimadas, na época, de 250 milhões de reais, segundo o diretor do DEIC – Departamento Estadual de Investigações Criminais da Polícia Civil de São Paulo, Wagner Giudice.

O furto ao Museu Green Vault, em Dresden, Alemanha, ocorreu em 25 de novembro de 2019 com perdas estimadas em 1 bilhão de euros, segundo Marko Laske, porta-voz da polícia alemã, em entrevista ao jornal Bild.

 

PASSO A PASSO DO FURTO À AGÊNCIA 0262 DO ITAÚ UNIBANCO

Dia 28 de agosto de 2011, às 20:35, a Sala de Segurança do Banco Itaú recebe uma solicitação de desativação do sistema de alarme de uma agência do Rio de Janeiro que seria reformada. Um agente criminoso, infiltrado da Sala de Segurança acompanha o procedimento, adultera os dados da solicitação e o sistema de alarme desativado é o da agência 0262, da Avenida Paulista.

Na sequência é a vez do segundo agente criminoso infiltrado na equipe de segurança entrar em ação, o vigia de plantão na agência 0262. Missão. Verificar se o procedimento remoto de desativação dos detectores da área dos cofres fora bem sucedido. Confirmada a desativação do alarme o caminho para uma invasão da agência 0262 sem percalços está livre.

Às 23:50, horário de transmissão da defesa do cinturão de Anderson Silva no UFC – Rio de Janeiro, doze assaltantes entram na agência e em uma ação que durou quase dez horas, arrombaram 170 cofres particulares, em média um a cada 3 minutos.

A fuga dos criminosos sem abordagem policial e o inquérito no DEIC ser aberto apenas em, 5 de setembro de 2011, assegurou aos criminosos 8 dias de dianteira sobre os investigadores e a possibilidade de agirem na ocultação de provas.

 

 

PASSO A PASSO DO FURTO AO MUSEU GREEN VAULT

Dia 25 de Novembro de 2019, um quadro de disjuntores da concessionária de energia elétrica da região do Museu Green Vault é sabotado e o entorno sofre um blecaute.

Às 5:00 horas da manhã, começa a invasão. Os criminosos arrombam uma janela com grades e entram no prédio até então considerado tão seguro quanto ”Fort Knox”, o cofre que guarda as reservas de ouro dos Estados Unidos. O alarme dispara, as câmeras de segurança do museu captam as imagens da ação e a polícia é acionada.

Um vídeo com duração de três minutos documenta o crime. Dois homens arrombam uma janela com grades, entram no prédio, utilizam um machado para quebrar os vidros blindados das vitrines de exposição, recolhem os conjuntos de joias e se evadem.

2 minutos depois do início da fuga dos criminosos a polícia chega ao museu, confirma o ocorrido e dá o alarme geral. Começa uma corrida de gato e rato, só que neste momento os ratos já tinham obtido uma vantagem insuperável como demonstraremos a seguir.

Se considerarmos que na fuga o veículo dos criminosos trafegou a 60 Km/h, no instante que a polícia chegou ao local os criminosos já haviam percorrido 2 km, fazendo com que a área de buscas fosse de 12,56 Km². Porém se considerarmos que o alerta geral ocorreu 1 minuto após os policiais chegarem ao museu, o veículo já percorrera 3 Km, fazendo com que a área de buscas fosse de 28,26 Km².  Como é fácil de perceber enquanto a distância percorrida pelo veículo aumentava linearmente, a área de buscas expandia-se exponencialmente, um obstáculo intransponível para as barreiras policiais serem efetivas.

O veículo esportivo utilizado pelos criminosos na ação foi posteriormente localizado queimado, um procedimento que chama mais à atenção que o simples abandono. Porém mais efetivo para a destruição de provas biométricas, incluindo a de coleta de DNA para construção das características físicas através do processo de fenotipagem.

 

 

O PENSAMENTO ESTRATÉGICO DOS CRIMINOSOS

 

 

Assaltos executados por quadrilhas profissionais são pensados em 6 etapas, cada uma com tempos de duração distintos: Planejamento (Meses/Anos); Preparação (Semanas/Meses); Coordenação (Dias/Semanas); Execução (Minutos/Horas); Fuga (Horas); Ocultação (Meses/Anos).

Assim se levarmos em consideração o tempo de evolução de cada etapa, o maior tempo de exposição dos criminosos ao risco de serem descobertos acontece nas três primeiras, nas duas seguintes o jogo é de gato e rato, ou seja os criminosos têm de realizar as etapas em tempos menores do que o da resposta policial, na última etapa, ocultação, os criminosos já ganharam uma dianteira considerável e se conseguirem a partir daí monitorar as investigações e destruírem  as provas incriminadoras manter-se-ão um passo à frente e fora do  alcance da justiça.

 

 

6 APRENDIZADOS OBTIDOS COM ASSALTOS MILIONÁRIOS

 

O que aprendemos com os furtos à agência 0262 do Itaú Unibanco e ao Museu Green Vault:

1º Aprendizado: O plano de segurança deve ser pensado como um produto em evolução continua.

A atratividade dos bens, a capacidade técnica dos criminosos e as medidas de proteção estabelecidas precisam ser continuamente reavaliadas e as vulnerabilidades detectadas tratadas.  Nos 2 casos as medidas de proteção implantadas subestimaram a capacidade dos criminosos. No caso da agência 0262 do Itaú, a infiltração de agentes na equipe de segurança e no Museu Green Vault, a realização de um assalto em tempo menor que o de resposta da polícia.

2º Aprendizado: Todos os incidentes por mais inocentes que pareçam devem ser investigados.

A execução dos assaltos sempre é precedida por atividades de planejamento, preparação e coordenação. Por isso, eventos como: pessoas aparentemente em campana, tirando fotos, fazendo medições, anotações, desenhos e perguntas, sobrevoo de drones, disparos acidentais de alarmes, falhas nas redes de energia e comunicação, veículos parados nas proximidades de instalações, objetos deixados em áreas sabidamente monitoradas pela segurança, são potenciais indicadores de mapeamento de pontos fracos.

Aprendizado: Colaboradores em especial os da equipe de segurança devem ser monitorados.

Colaboradores em geral e em especial os da equipe de segurança que aparentem riqueza sem origem ou passem por momentos de vulnerabilidade, a chantagem ou sedução precisam ser acompanhados e monitorados. No caso da agência 0262 do Itaú, o aliciamento e infiltração de agentes na equipe de segurança foi determinante para a execução e êxito da ação criminosa.

4º Aprendizado: Barreiras físicas devem ser precedidas por Sistemas de detecção.

No caso do museu, se existissem detectores de impacto a tentativa   de arrombamento teria sido reportada à Central de Monitoramento antes mesmo da grade da janela ser arrancada. Grades duplas nas janelas (uma externa e outra interna) e duplas vitrines blindadas, antecedidas por detectores fariam com que o tempo de transposição das barreiras ultrapassasse o tempo de resposta da polícia.

 

5º Aprendizado: A proteção de ativos de alto risco devem contar com no mínimo 3 linhas de defesa.

A estruturação de uma linha de defesa envolve a integração de 5 recursos: Ambiente Interno, Barreiras Físicas, Procedimentos Operacionais, Recursos Humanos, Recursos Tecnológicos.  No caso da agência 0262 do Itaú, os Procedimentos Operacionais mostraram erros que os tornaram facilmente corrompíveis: Adulteração da solicitação para desativar do alarme; Centralização em um operador a desativação de um sistema de alarme particionado; Permanência de um agente infiltrado na Sala de Segurança com visão privilegiada sobre as telas das estações dos demais operadores; um vigia em plantão de 12 horas sem rendição nem para refeições; Não incremento de procedimentos de verificação de integridade da agência após a desativação do sistema de alarme como: rondas presenciais, monitoramento por câmeras.    

 

6º Aprendizado: Procedimentos de suporte à investigação devem ser acionados imediatamente após o sinistro.  

No caso do Museu Green Vault havia um protocolo e foi colocado em prática tão logo foi percebido que a polícia não havia logrado êxito na captura dos criminosos em fuga. Fotos dos bens passaram a ser divulgadas com destaque na mídia internacional, assim como a oferta de uma recompensa de 500.000 euros por pistas, procedimentos que geram dificuldades para a ocultação dos bens. 

Já no caso da agência 0262, se no Banco Itaú havia um procedimento de comunicação às autoridades de assaltos com perdas expressivas e oferta de recompensa por pistas, por algum motivo não foi acionado. O crime foi notificado inicialmente ao 78º DP, o inquérito na Delegacia Especializada do DEIC aberto 8 dias depois do ocorrido e as imagens das câmeras entregues apenas 3 dias após o início das investigações pelo DEIC, além disso pouco mais de 10% dos clientes registram BO.

 

MÁRIO TAVARES


Atua no mercado de segurança desde 1985. Possui MBA e Graduação em Gestão Estratégica da Segurança Privada, além de cursos de Extensão Universitária nas áreas de, Gestão de Tecnologias Aplicadas à Segurança, Gestão de Continuidade de Negócios, Gestão de Riscos, Gestão de Crises, Inteligência Competitiva e Seguros.

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